Discurso mediático da xenofobia na África do Sul

Maputo, 11 de Janeiro de 23121 (Imbondeiro News) – Nesta edição, fazemosuma reflexão sobre a problemática da xenofobia, na África do sul, partindo da dicotomia que existe entre os termos “nós” e “outros” e do papel jogado por alguma imprensa, por considerarmos como sendo linha de força na propagação do fenómeno.
Por nós compreendem-se os sul-africanos, que se posicionam como receptores dos outros, neste caso os imigrantes africanos. É interessante notar que a fronteira entre ambas as partes nos remete para uma ruptura de relações, intolerância e animosidade.
A interacção entre os dois lados torna-se difícil, devido à exaltação ou enunciação de atitudes xenófobas.
Portanto, a discriminação de que são sujeitos os estrangeiros africanos, incluindo moçambicanos, não passa mais de um produto deteriorado de relações, pela simples razão de os locais não se esforçarem em se socializar com os vindouros.
Descrevem os imigrantes de extraterrestres, seres estranhos que se originam fora da Terra. Dentre as outras palavras empregues para referirem a imigrantes africanos, destaca-se: manadas, alienígenas, esquisitos, forasteiros, exóticos, gangues, bastardos.
Também equiparam os assaltos xenófobos como se tratando de uma guerra. Elucidam que a referida guerra é necessária, legítima e justa, face a presença de tais manadas de exóticos e bastardos.
O discurso discriminatório, quer institucional, quer mediático, é basicamente proferido em termos do outro, que serve para marcar a diferença entre os nacionais e estrangeiros africanos.
Um outro aspecto que nos parece favorecer a propagação do problema e que merece a nossa atenção é a propalada superioridade dos sul-africanos em relação a estes outros. Para os que se identificam com este pensamento recusam qualquer tipo de contacto, cruzamento ou mistura com o outro.
Este preconceito é fundamentalmente estimulado pelo desconhecimento do outro. É um conflito que se desenvolve e ganha adesão, à medida que os media difundem informações imprecisas e generalizadas acerca deste mesmo outro.
Neste cenário, assiste-se, com certa persistência, a alguns órgãos de informação sul-africanos a usarem, para descrever o estranho, termos pejorativos: makwerekwere e maguirigamba. Alguns desses sectores são apontados como sendo a linha de força na propagação do fenómeno
A África do Sul vê-se assim mergulhada num clima de animosidade a africanos, por conta da postura assumida por alguma imprensa, o que acaba comprometendo a imagem pela qual este país lutou durante décadas.
Os repúdios levados a cabo por sul-africanos, exigindo a melhoria dos serviços, têm dado lugar ao discurso de ódio contra africanos de outras partes do continente. Desta forma, cidadãos comuns abraçam a violência, por considerá-la solução para os seus medos e degradação das condições de vida.
Alegações imputando a cidadãos africanos de estarem a roubar empregos e parasitar o Estado, ora de serem criminosos, trazendo miséria e doença para a nação do arco-íris, são em grande medida alimentadas por sectores da comunicação social.
Estamos perante um discurso que tem sua influência entre os que se consideram deixados de lado, em decorrência da vinda ao país de imigrantes africanos.
A situação influi directamente para o mal-estar de reações, por causa do medo de que a nação idealizada deixe de ser como é no seu imaginário e que outras identidades – os alienígenas tomem seu lugar.
Não se pode negar de forma alguma que a violência resulta da degradação das condições de vida. Também acreditamos, de forma peculiar, que a comunicação social, ou seja, o Jornalismo é parte activa do problema, ao veicular mensagens que culpabilizam o imigrante africano, comumente visto como inimigo.
Analisando os conteúdos noticiosos, nota-se o persistente exacerbamento da tensão por certos órgãos de informação, o que influencia indivíduos ou grupos sociais mal-entendidos a tomarem acções extremas no seu relacionamento com cidadãos de outras partes do continente.
Além de animar o mal-estar de relações, imagens retratando imigrantes africanos de seres inferiores aos sul-africanos não têm outra finalidade, senão a de pôr ambas as partes em camas separadas.
Deve-se, no entanto, sustentar que o Jornalismo sabe como persuadir ou convencer um dado público para a necessidade de olhar para o seu discurso como verdade absoluta. Aliás, a comunicação social trabalha em torno da verdade e efeitos dessa mesma verdade.
Ao enunciar, por exemplo, a situação dos moçambicanos nunca o fazem sem construir antes a sua realidade, podendo até ser uma realidade distorcida ou não, sob suposição de não existir discurso isento da verdade.
Uma vez que o seu papel é de aproximar as pessoas, a comunicação social aparece referenciada como parte activa do problema, ao difundir conteúdos carregados de antipatia à presença de imigrantes.
Nesta senda, o Institute for Democracy of South Africa (IDASA) consubstancia a nossa tese, ao ter verificado que certos media são tendenciosos quando falam de assuntos relacionados com a presença de moçambicanos.
Mostra que 17 por cento, num universo de 950 artigos noticiosos produzidos durante a tensão xenófoba por vários órgãos de informação, usaram metáforas: cheias, ondas e manadas para descrever o fluxo de imigrantes moçambicanos, 22 por cento de outros acusaram, os nossos concidadãos de serem criminosos e por 20 por cento de estarem ilegalmente no país.
Além disso, ilustra que a comunicação social empregou termos bombásticos e tendenciosos, como operações de desmantelamento ou de limpeza de desumanos, operação contra terror alienígena e guerra sobre desumanos.
Em Writing Xenophobia: Immigration and the Print Media in Post-Apartheid South Africa, Africa Today, Danso Ransford & McDonald David dizem que a comunicação social não se dissociou da problemática, por ter havido correlação directa entre artigos jornalísticos e a violência.
Os dois estudiosos anotam, porém, que os media sul-africanos instigam a situação, através de estigmatização de imigrantes africanos e de usarem linguagem inapropriada quando tratam de assuntos da xenofobia.
Alguns jornais são parte da tensão, ao publicarem materiais noticiosos dando ênfase a termos de o país estar inundado, invadido por manadas de exóticos.
A liquidada South African Press Association (SAPA) como um destes órgãos de informação que usaram termos ofensivos contra africanos, ao descrevê-los de serem ladrões de empregos, de mulheres e de maridos.
Ransford Danso e David Alexander elucidam que a incriminação e condenação de que são sujeitos os imigrantes moçambicanos foi notável antes e mesmo durante a ocorrência dos tumultos. McDonald observa que grande parte da cobertura jornalística foi negativa e não era crítica aos assaltos.
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