Reflexão sobre xenofobia na Africa do Sul

 Reflexão sobre xenofobia na Africa do Sul

A informação que tem sido veiculada dando conta de os imigrantes africanos serem a causa dos problemas socioeconómicos, com destaque para a eclosão da xenofobia, na vizinha África do Sul, tende a perder credibilidade, com novos estudos a atribuírem culpa à alegada má governação e corrupção, nas instituições públicas do país.

A agência noticiosa Lusa faz menção à uma pesquisa conduzida pelo Institute of Security Studies of South Africa (ISS), que indica que “muitos políticos, funcionários públicos e outros dirigentes sul-africanos fazem regularmente declarações anti-imigrantes que alimentam a xenofobia”.

É de referir, no entanto, que a primeira onda deste surto começou em Abril de 2008. Desde então, passou a ser recorrente para grupos de sul-africanos saírem à rua e protagonizarem assaltos violentos contra imigrantes africanos, por estes usurparem as suas oportunidades.

No entanto, olhando para o idealizado futuro crescimento socioeconómico sul-africano, o mesmo já parece não ser tão auspicioso como se previa logo após a abolição do apartheid, em 1994.

Por exemplo, o desemprego, a pobreza e a falta de oportunidades tornaram-se grandes problemas para o país.

Em vista disso e, como se costuma dizer que “em casa onde não há pão, toda a gente ralha e ninguém tem razão”, quadrantes da vida, com destaque para os desfavorecidos, acham que a melhor solução é recorrem a assaltos contra africanos de outras partes da África.    

No seu livro When Mandela Goes, the Coming of South Africa’s Second Revolution (1997), o jornalista sul-africano, Lester Venter, cita Manfred Woehlcke, pesquisador do Instituto Alemão para Assuntos Políticos e Económicos, diz que quando o milénio terminar, haverá em todo o mundo, cerca de seis biliões de pessoas, das quais um bilião será de ricos, um outro bilião estará entre os ricos e pobres, um outro bilião integrará os pobres e os restantes três biliões compreenderão os desesperadamente pobres.

Portanto, o problema da pobreza, que não somente afecta a África do Sul, tende a agudizar-se quase em todo o mundo, com os pobres a ser um segmento da população mais pobre e os ricos cada vez mais ricos.

Dados divulgados, no primeiro trimestre de 2016, pela Statistics South Africa, o desemprego situava-se na ordem de 26,7 por cento, contra os 25,5 por cento, nos finais de 2015. Em 1994, segundo a fonte, o desemprego era de 20 por cento.

Desde então, a taxa de desemprego continuou a subir, tendo, por exemplo, em 2019, atingido 29 por cento, contra 27 por cento, em 2018. Até Setembro de 2022, o índice de desemprego estava na ordem de 33,9 por cento, considerado o mais elevado numa lista de 82 países monitorados pela Bloomberg.

Percebe-se agora que o desemprego reflecte o fraco crescimento económico que este país da região tem vindo a registar, nos últimos anos, situação que, de alguma forma, tem causado violência em vários pontos.

Em 2009, O coeficiente de Gini, método usado para medir a desigualdade social, atribuiu, em 2009 a África do Sul, 0,63 pontos. De acordo com os critérios usados pela pesquisa, quanto mais próximo de ponto 1, maior é a desigualdade social.

Como se pode depreender, partes da sociedade desfrutam de condições socioeconómicas equivalentes à riqueza dos países mais desenvolvidos, enquanto outros grupos sociais, sobretudo a maioria, vivem em situações de privação e exclusão.

A Statistics South África revelou em 2007 que pelo menos 50 por cento da população negra sul-africana vivia abaixo do nível de pobreza.

A fonte mencionou que muitas famílias ainda não tinham acesso à água potável, energia eléctrica, saúde e educação, um problema que não era esperado, porque para muitos a nova dispensação significava um momento que os levaria a ascender, automaticamente, a outra categoria na sua vida.

O ISS concluiu que as melhorias na habitação, fornecimento de electricidade e água potável, saúde e educação, que eram previstas depois do fim do apartheid, não se têm materializado de forma desejada.

Para Moeletsi Mbeki, do Institute of International Affairs of South Africa (IIASA), o fracasso que se verifica na prestação dos serviços básicos e alegados casos de corrupção nas instituições do governo são as razões pelas quais os sul-africanos odeiam os outros africanos.

Winnie Madikizela-Mandela (falecida) dizia que a xenofobia era o resultado das más políticas económicas em relação aos pobres e falta de melhoria na prestação dos serviços.

Saki Makozoma, empresário e presidente do Business Leadership South Africa (BLSA), olha para este fenómeno como se tratando de associações de frustrações dos sul-africanos, devido aos maus serviços prestados pelo governo, falta de liderança e um legado do apartheid.

Nesta reflexão, não podemos de alguma forma negar ou ignorar que a xenofobia esteja relacionada com o fim da discriminação racial e a entrada massiva de imigrantes. Mas a desigualdade e alegada má prestação dos serviços são aspectos que também podem ser tomados em conta.

Embora não nos dissociamos destes pensadores, somos de opinião da necessidade de também se reflectir sobre o papel dos media no combate a atitudes hostis à presença de cidadãos africanos, bem como do seu envolvimento na construção de um discurso que explique as causas desta maldade social.

Portanto, nada mais resta dizer que qualquer abordagem que se queira fazer acerca deste fenómeno deve ser abrangente e ter a comunicação social como o sector de convergência dos variados saberes, dentro do contexto económico, político e cultural sul-africano.

Maputo, 20 de Janeiro de 2022 (Imbondeiro News)

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